quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O Obscuro Encanto de Vampiro: A Máscara


O Role Playing Game Vampiro: A Máscara (Vampire: The Masquerade, no original inglês) teve a sua primeira edição lançada nos Estados Unidos em 1991. No ano seguinte recebeu o prêmio Origins para melhor conjunto de regras de RPG. E o prêmio foi merecido, pois trata-se de uma obra clássica, e um dos primeiros jogos do gênero lançados no Brasil. De fato, por muito tempo o nosso país foi local de publicação apenas da trindade Dungeons & Dragons, GURPS e Vampiro. Sem contar os brasileiros Tagmar e Desafio dos Bandeirantes. Só rencentemente outras opções RPGísticas vieram a ser disponibilizadas, vide o excelente trabalho que as editoras indies brasileiras vêm realizando.


O jogo foi criado por Mark Rein-Hagen, que também é um dos co-autores de Ars Magica. Hagen soube criar um sistema limpo e eficiente que utiliza somente dados de dez faces. Além do mais, o sistema de jogo de Vampiro batizado de Storyteller (traduzível como contador de histórias em português) prioriza antes de qualquer coisa a ambientação, a interpretação e a contação de estórias. As regras priorizam o contá-las em grupo, uma característica dos RPG's que já foi muito citada em diversos estudos sobre esta forma de jogo e sua relação com a educação. Há RPGistas que preferem um cenário menos detalhado, sob o argumento de que um grande detalhamento retiraria um pouco do "livre-arbítrio", da liberdade, tanto de jogadores quanto de mestres. Já eu, pessoalmente, fã de Tolkien e Frank Herbert, acho uma ambientação bem feita e detalhada uma faceta apaixonante de qualquer jogo, seja RPG, boardgame, ou jogos eletrônicos.


Não à toa, dada a riqueza de ambientação, uma divertida e particularmente rica vertente dos jogos de interpretações ganhou popularidade nos EUA e no Brasil em virtude do advento do sistema Storyteller. Refiro-me aos chamados LARP's (Live Action Role Playing), que consistem em uma mistura de jogo e de interpretação teatral, no qual os jogadores (ou atores) interagem entre si encarnando os maneirismos e as virtudes e defeitos dos personagens que decidiram interpretar. Tudo em nome da diversão e interação social. E nessa esteira, o RPG, de diversão pura e simples, passa a adquirir tons e profundidades de uma verdadeira arte. Com tudo que esta pode oferecer em termos de aprendizado e prazer.


Uma das características mais marcantes não só de Vampiro mas também dos outros jogos do sistema Storyteller é a sua densidade psicológica. A ambientação tem como cenário o mundo moderno. No entanto esta se passa em mundo moderno ainda mais obscuro, cheio de mistérios e sinistro. Criaturas da noite e da lua como lobisomens e fantasmas transitam num misto de realidade e sonho. Seres feéricos tão cruéis como o são originalmente nos antigos contos de fadas aparecem em nossos sonhos -- e nos nossos pesadelos mais distorcidos. Magos manipulam a realidade consensual tão facilmente que a fronteira entre a imaginação e a mera loucura tornam-se ambíguas. Todos esses seres nada mais são do que metáforas para aspectos de nossa própria condição humana. Surgem questões filosóficas profundas, o jogador é levado a criar, e a se confrontar consigo mesmo tanto durante a criação dos personagens, quanto durante o desenrolar das sessões de jogo. Recordo de um personagem criado por mim que era um cigano do clã Ravnos para o qual escrevi um conto inteiro tendo como objetivo detalhar aspectos de sua vida, motivações e crenças pessoais. E esse personagem tomou vida na minha mente e me fez, de certa forma, me apaixonar por literatura. Além disso na empolgação criativa eu passei a pesquisar sobre a cultura cigana, inclusive sobre nomes ciganos, para melhor interpretar e caracterizar o personagem.


Neste mundo Punk-Gótico (Mundo das Trevas, World of Darkness) os vampiros tem uma organização social toda própria, e suas maquinações e intrigas em torno do poder são ainda mais assustadoras do que as dos políticos em nosso mundo. Pois envolvem literalmente sangue, fome, imortalidade e a besta feroz que reside no fundo de todos, onde a razão, a decência e a civilização não têm vez. É um clima tenso, onde a humanidade que resta é o item mais valioso para todos, antes que o universo inteiro rua, vítima do caos e da insanidade. "A Máscara" do título do jogo, portanto, nada mais é que a maneira que os vampiros, seres atormentados, têm de se manter invisíveis à maioria dos seres humanos em favor de sua própria existência (quase) imortal. E além disso de manter longe de si a própria monstruosidade interior que carregam no fundo. É uma luta constante entre a humanidade restante nas suas almas e a crueldade. Não custa lembrar que um dos atributos do jogo contido na ficha de personagem do jogo chama-se humanidade. E conforme o personagem vai perdendo pontos neste atributo ele fica mais suscetível a ter crises de descontrole físico e mental, chamadas de frenesi.


Vampiro: A Máscara é um ápice. Mistura psicologia, jogo, arte, filosofia, teatro. As grandes questões estão todas lá: vida e morte; imortalidade; paixão e sensualidade; magia e mistério; terror e redenção. Cabe ao narrador e aos jogadores criarem a maneira que mais lhes apraz de contar suas estórias no Mundo das Trevas. E que o tédio seja definitivamente deixado de lado.

Essa densidade psicológica serve de pano de fundo para alguns RPG's muito bons como o sueco Kult ou o brasileiro Trevas. Alguns inclusive até antecederam V:AM. Que fique bem claro que a temática desses jogos é adulta, e lida com temas fortes, metafísicos e, por que não, essenciais. São jogos para adultos. O que não significa que adolescentes não possam retirar proveitos e diversão do sistema storyteller. É uma brincadeira? Sim, mas com desdobramentos sérios.


Além da ambientação e do sistema de jogo em si, qualquer RPG que se torna um clássico prima pela excelente qualidade de suas ilustrações. Com V:AM não poderia ser diferente. Um dos grandes responsáveis pelo primor de sua arte interna é o artista Tim Bradstreet, que desenhou também algumas capas antigas da estória em quadrinhos Hellblazer e cujo trabalho procurei realçar neste artigo, por captar muito bem a atmosfera e a época em que o jogo foi lançado no começo dos anos noventa.


O livro inteiro contém as mais diversas citações das mais variadas fontes possíveis. Encontra-se de tudo: o filósofo Nietzsche, a banda Body Count, o poeta inglês P.B. Shelley, o psicólogo Jung... O que vem a realçar muito a ambientação densa da obra.


Vampiro não é só um jogo. Sua ambientação Gótico-Punk forçosamente cria ressonâncias e propõe metáforas que nos ajudam a entender e a experimentar o mundo moderno de uma forma mais completa. A contraposição e mistura entre forças humanas e o caos do universo circundante, o sombrio, o sexy, o gótico e o punk todos fazem com que a experiência do jogo seja emocionante e inesquecível.

7 comentários:

  1. Legal o post. Me ajudou a esclarecer o que não sabia muito bem sobre vampiro ;)
    E bem vindo ao blog lol

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  2. Valeu, Pedro! =D
    No futuro pretendo abordar Vampiro: Réquiem e demais produtos storytelling!

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  3. eu realmente achava vampiro uma historia muito legal. nao apenas a politica, mas o misterio abordado eram bem bacana.

    o unico problema, e q nao é do sistema, é q joguei com pessoas q fizeram que eu nao gostasse de jogar :P

    na epoca de ouro da santa trintade do RPG, achoq poucos sabiam "mestrar direito", no sentido de "fazer as burradas classicas" de cada sistema (epoca q noa tinha internet disponivel como hj)

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  4. Realmente um clássico, nunca fica ultrapassado, mas podiam ter explorado mais o idade das trevas.

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  5. Salve, Rafael!

    Pois é, o mais legal em Vampiro é que ele abre quase infinitas possibilidades de interpretação e de construção de personagem. O mais divertido sempre foi esta criação. Diferente de GURPS (que também é divertido pacas) mas que focaliza mais no realismo e nas regras de combate. São experiências de jogo diferentes.

    Aliás, salvo engano, o suplemento de Vampiro:A Máscara para GURPS tb levou o Origins. Eu tenho ele aqui e posso garantir que foi merecido... =)

    Abs,
    Rodx

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  6. Saravá, Lucas!

    Valeu pelo comentário! Pois é, Vampiro: A Idade das Trevas é outro clássico e merece ao meu ver um espaço todo próprio. Inclusive por coincidência, é um dos livros que estão na minha escrivaninha esperando uma releitura cuidadosa.É impossível não ser saudosista com tanta coisa boa antiga, não é mesmo? =)

    Abs,
    Rodx

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