quarta-feira, 27 de abril de 2011

Lição: Lidando com o poder

Olá, classe! Atendendo a pedidos, a lição de hoje será sobre Personagens poderosos. Como manter os desafios? Como lidar com Personagens mais poderosos que reis? Enfim, olhos à lousa!

Antes de começarmos, meu muito obrigado aos comentários dos últimos posts. Vocês trouxeram ideias maravilhosas, algumas até melhores que as apresentadas nas lições! É exatamente isso que eu queria: iniciar um debate sobre um tema, não apenas dar minhas ideias.

Enfim, na sequência de lições sobre experiência, nosso amigo Arantes sugeriu um post sobre os Personagens que deixam o poder subir à cabeça. Realmente, um assunto interessante e importante, tanto para Jogadores quanto para Mestres.

"Nem todo o poder do mundo pode mudar o destino."

A Subida ao Poder


A maior parte das campanhas de RPG começa com um grupo de Jogadores de baixo nível. Nas primeiras aventuras, eles andam por vilarejos, livram cidades de alguns monstros, invadem masmorras e criptas abandonadas repletas de monstros e potes de ouro. Com isso, ganham experiência, sobem níveis, ficam poderosos. É evidente que o estilo de campanha precisa mudar. Matar-pilhar-destruir já e fácil demais para eles... é preciso ter algo novo...

Eu costumo separar os níveis do seguinte modo:

1 ao 5 - Zé-roelas. Poucos ouviram falar, possuem poucos (ou mesmo nenhum) itens poderosos e pouca grana.
6 ao 10 - Úteis. Conhecidos na região, podem ser contratados pelos governantes, possuem ao menos um item mágico danado. A grana ainda é um problema, embora menor, mas ainda um problema.
11 ao 15 - Campeões. Seus nomes e feitos já começam a correr nas grandes cidades. Já possuem muita grana e itens poderosos. Se eu fosse o Mestre, já colocaria uma trupe de seguidores no encalço deles, desde o jovem guerreiro ao escudeiro atrapalhado.
15 ao 20 - Lendas. Boa parte do mundo conhece os feitos do grupo. Os governos já não os contratam pelo valor exorbitante que cobram. Assim como a quantidade de grana, aumenta a quantidade de inimigos que desejam a cabeça de nossos heróis. Eu exigiria a construção de uma fortaleza ou mesmo um feudo. Muitos seguidores. É praticamente visitar uma grande cidade sem ser reconhecido.
20 ao Infinito - Semideus. Sinceramente, dúvido muito que algum Personagem sobreviva tanto tempo e mantenha-se na ativa. É o momento de botar as chuteiras no prego e aproveitar o que você consquistou. Se, ainda assim, seus Jogadores querem ir além, é hora de colocá-los diante de alguns avatares, deuses-menores ou até mesmo o Tarrasque.
"Homens realmente grandes, não nascem grandes, tornam-se grandes."
Porém, até mesmo nos níveis mais baixos, pode ser que o Jogador tenha encontrado um item mágico, ou, quem sabe, uma brecha nas regras para ter um Personagem muito poderoso em pouco tempo. Não importa o meio, em algum momento qualquer Personagem tornar-se-a poderoso. Logo, nada é desafiador para ele... o Mestre diz "vocês observam um grupo de 20 bugbears atacando a cidade" e o(s) Jogador(es) apenas respondem: "eu corro para cima deles brandindo meu machado ígneo +5 vorpal".

Mas, será que é errado tornar-se poderoso? Não é essa a intenção ao acumular milhares de XPs? O problema não está em ficar poderoso, mas sim saber o que esse poder trás consigo. Lembram a velha e batida frase do Homem-Aranha: "com o poder, vem grandes responsabilidades". É disso que Mestres e Jogadores esquecem ao longo da campanha...

O Poder em Si

Nosso primeiro ponto é compreender o que significa ser poderoso. Geralmente, os Jogadores acreditam que quanto mais níveis alguém possuir, mais poderoso será. Nada poderia estar mais longe da verdade. Ao menos em minhas mesas, reis não são guerreiros poderosos que ascenderam ao poder, agora, tente assassinar um deles. Sim, dinheiro também é poder. E o que dizer da influência religiosa? Em nossos mundos medievais fantásticos, não é difícil encontrar um sacerdote de nível baixo com um exército de seguidores.

E, além disso, ao menos em RPG, essas três formas de poder fazem parte do mesmo pacote: em níveis mais altos, os tesouros também são altos e a fama acaba trazendo a influência. Pense na seguinte situação: um grupo de aventureiros sai de um vilarejo minúsculo, enfrenta alguns mosntros e, após algum tempo, extermina um dragão que vinha encomodando as redondezas. Não há dúvidas de que a história vai correr o mundo. Logo, pessoas ouvirão os feitos, assim como inimigos. Uma visita a uma grande cidade pode acabar tornando-se um grande evento!

Como Lidar Com os Poderosos


Mestres, antes de tudo, lembrem que vocês são os juízes. Não deixem que as regras façam seu jogo desandar. No Sistema D20, creio que a regra mais desgraçada nesse quesito são os pontos de vida. Imagine um bárbaro de nível alto... ele não só tem dezenas de PVs como ainda pode ativar sua fúria. Aí, cabe a você determinar o que os RPGs representam. Se esse bárbaro fosse cercado por seis ou sete goblins armados com bestas, eu não hesitaria em dizer que ele está em maus lençóis. "Como?", grita o Jogador indignado ao fundo. Galera, não importa quantos mil PVs seu Personagem tenha, em uma situação como essa, dificilmente qualquer um sobreviveria. São seis setas simultaneamente em seu corpo, provavelmente no tronco e na cabeça! "Ah, mas e a armadura?", lembrem que as bestas foram as primeiras armas a tornar as pesadas armaduras completamente inúteis. Consta que Ricardo Coração de Leão morreu com um tiro de besta em seu peito, pois a seta atravessou sua placa de aço...

Eliminado o problema dos PVS (já é um assunto BEM batido, basta fuçar um pouco nos blogs de RPG e você achará vários posts sobre isso), vamos a algumas regrinhas simples para lidar com Personagens poderosos, tanto para Mestres quanto para Jogadores:

"Mas agora você vem até mim e diz: Don Corleone faça justiça..."

* Poder significa responsabilidade. Se os seus Jogadores invadiram a taverna e, por acharem-se poderosos, desafiaram todos para uma briga, tenha certeza de colocar os guardas no encalço deles. E vale lembrar que guardas medievais não seguiam nada referente a direitos humanos, modos de abordagem e blá, blá, blá... o "meliante" mostrou-se perigoso para uma prisão, setas nele! Uma ou duas saraivadas de guardas armados com bestas serão o suficiente.
Jamais deixe que seu grupo saia impune apenas por se mais poderoso que os demais.

Por outro lado, as pessoas comuns esperam que seus heróis estejam à altura de tal título. Se o famoso e lendário guerreiro Ossur chega a uma cidade e não dá atenção ao líder local que queria falar com ele, muitos espalharam a notícia e a fama de esnobe logo arrancará vários aliados do caminho de Ossur. Quanto mais poderosos, maiores serão os exemplos a serem dados.

* Poder significa chamar a atenção. Ser poderoso e discreto é algo muito difícil. Mesmo em cenários medievais, sem internet ou TV para divulgar as ações do grupo, é muito provável que os bardos façam o papel de paparazzi e levem os feitos e nomes de nossos heróis pelo mundo.

E o que isso tem de mais? Ora, em primeiro lugar, pense em quantos aventureiros irão querer aprender ou mesmo fazer parte de um grupo poderoso? Você já pensou em aprender a tocar guitarra com Jimmi Hendrix ou baixo com o Paul? É mais ou menos isso... tietagem medieval! Nem só de raparigas fogosas vive um heróis: dezenas de escudeiros tentarão de tudo para estar ao lado da solene figura.

Se o Personagem é um clérigo ou mago, a coisa só piora... "você é Froyas, Chagas de Kelemvor? Verdade que foi ele quem deixou essas cicatrizes em suas mãos? Uau! Me ensina a falar com ele? Posso ser teu discípulo?".

Claro, você não precisa só empurrar bombas para seus Jogadores. Aliados poderosos serão ótimos para o roleplay. As regras de AD&D (e de nosso querido Old Dragon) dizem que um guerreiro de nível 10 pode construir uma fortaleza e atrair cavaleiros para formar seu exército. Uma pena que a terceira e quarta edições foquem apenas na ação individual... erguer sua própria fortaleza é simplesmente demais!

Se grandes aliados surgirão, evidentemente que grandes inimigos também. Talvez o pai (melhor, o avô) daquele dragão adulto morto há três níveis atrás queria acertar as contas com nossos rapazes. Além de inimigos solo, teremos as organizações: a guilda de ladrões não hesitará em gastar uma pequena fortuna para eliminar aquele paladino que anda desmantelando os planos da organização.


"Deixe que seus amigos subestimem suas qualidades e que seus inimigos superestimem seus defeitos."
*Quanto maior o poder, maiores os desafios. Tenha em mente que RPG não é video-game, tudo pode acontecer! Personagens épicos exigem ações e decisões também épicas. O destino de reinos ou mundos poderia estar na mão desses figurões. Faça-os sentir a importância do Personagem para o mundo de jogo: "apenas o maior feiticeiro do mundo poderá detê-lo, é por isso que lhe convocamos, Eryn dos Estigmas de Fogo!".

E como desafiar grupos poderosos? Os bestiários sempre trazem monstrengos dignos de batalha, mas, mesmo eles, podem não ser páreo para alguns grupos. Eu acho que o ideal são as organizações: elas fornecem chances de encontros políticos e combativos muito intensos. Em minha campanha regular, o grupo já pisou nos calos da igreja de Cyric e das fadas-demônio da Casa Dlardrageth (e olha que estão apenas no nível 6...).

Vá levando sua campanha até o limite épico, o desafio final, o momento derradeiro. Como já disse em um post anterior, você não precisa fazer isso de antemão, mas vá construindo ao longo da saga.
Finalizando

Essas são minhas ideias sobre como lidar com os poderosos. Evidentemente, não é tão fácil quanto parece, mas o bom e velho bom senso auxiliará muito a Mestres e Jogadores. Agora, é hora do debate! Vamos aos comentários e até a próxima lição!

P.S: o post foi ilustrado por imagens de "O Poderoso Chefão", filme mais do que básico para quem quer entender como funciona o poder.
Prof. AlessandroAlessandro é professor de Inglês, Espanhol, Português, Religião e Literatura devido à profissão. Cineasta, cientista, astrônomo (não astrólogo...), artista plástico, ator, músico, linguista, poliglota, crítico e escritor devido à paixão. Leitor, RPGista, nerd, cinéfilo, enólogo e ocultista devido à diversão. Maníaco por cultura devido a algum mal genético. Ah, e chato, por pura força de vontade.

16 comentários:

  1. Primeiramente gostei muito do post, realmente bem formulado. É muito bom também ver que podemos participar de forma direta/indireta na realização dos posts.
    Apesar de não parecer, muitos jogadores, até os mais experientes deixam o poder subir a cabeça dos personagens. E quando os mestres mostram que a coisa não é bem assim, alguns desanimam pois realmente acham-se deuses, esquecendo inclusive que a jornada até aquele ponto foi árdua. Além disso muitos se decepcionam com o seguinte fato: "pô, sempre tem alguém mais forte do que eu". Mais uma vez digo que gostei muito do post e que bastante pode ser debatido. Em minha concepção é exatamente o que o Prof. Alessandro disse, deve-se manter uma constância no jogo, com uma elevação de poder gradativa, e não poupar os jogadores por seus atos. Não deve ser feita uma certa vista grossa para algumas atitudes de início, porque essas coisas se acumulam, e quando vc quer "botar ordem na casa" a coisa vai desandar, desanimando mta gente.

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  2. Muito bom o post e ótima referência do Poderoso Chefão.

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  3. Poder!!! *.*

    Bom, eu acho até legal a parada do overpower, porque aí a gente pode fazer o que quiser. O RPG é outro mundo, se a gente quiser poder de verdade, vamos virar bandid... quero dizer... políticos no mundo real ^^

    Se bem que coisas verossimilhantes são interessantes também...

    Hm... fiquei indeciso agora, mas de qualquer forma gostei do post ^^

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  4. @encaitar: ficou indeciso em virar bandi, quer dizer político, um rpg overpower ou um com verossimilhança metajogo? Não entendi. ^^

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  5. Eita, acabo de ter uma outra idéia de post hehehhe.

    Pq os grandes poderosos do mundo não vão lá e dão um jeito na coisa, visto que eles tem poder pra isso. Resumindo, pq o mundo vai ser destruído se os PJ's (nível 18- 20) não se envolverem, visto que existem vários Elminsters, Khelbens, Drizzts, Simbuls, Alustrieis, Maskar wandses e toda uma corja poderosa bondosa e maligna? é uma boa idéia de post, acho eu.

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  6. Humm.
    É mesmo, depois de um tempo os jogadores se acham invencíveis... Dá até saudade dos níveis iniciais.

    Depois de uma aexperiência com o Clérigo, acredito que PVs não são mais necessários!

    Estamos chegando num apse do Role Play, onde até mesmo os ferimentos serão interpretativos.

    Muito bom o post professor!

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  7. Dá-lhe professor! Esse até merecia entrar nos posts recomendados dessa semana... mas será que alguém que leia os posts recomendados já não terá lido este post antes??? OO

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  8. Muito bom Professor... Taí uma coisa que deixa qualquer mesa louca... o Excesso de poder...
    Acho que uma coisa que o Mestre pode fazer pra mostrar para os PJs que mesmo tendo tanto poder eles não são imortais é matar um NPC iconico e poderoso do cenário, mostrando como mesmo sendo muito poderoso ele foi derrotado...
    E sempre vai haver os Deuses também né...

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  9. Excelente nobre arauto do conhecimento! Como mestre perpétuo de minha mesa (por falta de mais algum candidato a tarefa) já tive minha cota de jogadores problema. Esse artigo é bem legal para dar uma ajuda a mestres em crise com seus jogadores.

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  10. Mio filho, má que bela cosa (a incomparável voz de Don Corleoni)

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  11. @Arantes: um rpg overpower ou um com verossimilhança metajogo ^^

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  12. Mas o que vcs acharam da minha sugestão de próximo post depois desse? Válida?

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  13. Vou sugerir um tema para o futuro:

    Tema: Bibliotecas em mundos de RPG como D&D.

    Os livros de RPG de D&D colocam bibliotecas como algo comum e banal, como se toda cidade tivesse uma.

    A maioria do povo é analfabeto, bibliotecas possuem livros que são caríssimos.

    A biblioteca não cobra nada para deixar qualquer um meter a mão nos seus livros caro de graça?

    E quais sistemas de segurança usam para não terem seus livros roubados? ( já que são caros e valem alguma coisa).

    Daí vem outro tema, como é a educação na visão de D&D medieval? ( lembrando que o mundo medieval de D&D é bem diferente em termos políticos/religioso/social do mundo medieval real nosso.)

    Como as pessoas comuns, o roceiro cheio da grana aprende ler/escrever ?

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  14. Olá novamente! Muito bom post e comentários! Sou novo neste universo blogger e fico feliz te ter encontrado "o clerigo" para leitura diaria. Com muitos autores e de boa qualidade, sei que sempre vou encontrar um post interessante aqui xD

    Acho q eh tudo uma questão de estilo e de combinar as coisas antes: D&D por exemplo é claramente um jogo que dá preferencia ao combate (n impede a intriga nem o roleplay, mas valoriza o combate).
    Uma sugestão de post futuro seria a real função do mestre, que é proporcionar e garantir a diversão do grupo, como um todo: desde a parte de madiação até o estilo da sessão. O mestre está lá para servir, se o grupo quer algo overpower e com muita porrada, dê isso a eles. se quer intriga? idem.
    quanto a pq os poderosos n fazem as coisas pros jogadores ? pq eles tem mais o que fazer, tem problemas Bem maiores pra cuidar. Na trilogia Tormenta fica claro isso: grandes personalidades só se envolvem quando os problemas os atingirão diretamente, e quando é um disafio q realmente "só dá pé pra eles".
    e adorei a ideia do post sobre bibliotecas! magnifica!
    =]

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