quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Lição: Campanhas Despreparadas


Olá, classe! Para quem já está acompanhando esse intensivo de como mestrar sem tempo, já deve saber qual é o assunto da aula de hoje. Sim, após vermos como criar aventuras de modo mais rápido e intuitivo, agora trataremos de como uni-las umas às outras, ou seja, falaremos sobre campanhas.
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Preparar uma campanha. Aí está um trabalho ao qual nunca me dei. Talvez por não ter começado com o D&D, cujo Livro do Mestre apresenta uma infinidade de tabelas e dicas para criação de campanhas. Desprovido de auxílio, precisei lançar-me no caos da improvisação e aprender tudo na prática. Apesar de difícil, creio que me dei bem. Para ser sincero, mesmo agora, jogando D&D, sequer li a seção sobre Campanhas do Livro do Mestres. Eu prefiro "brincar de deus", não "ser um deus".

Se criar uma aventura já é trabalhoso, o que se dirá de uma sequência delas, formando uma saga ainda maior. A primeira coisa que precisamos ter em mente é evitar a criação antecipada da campanha. Eu já perdi preciosas horas escrevendo sobre vários PDMs que sequer apareceram nas aventuras. O mesmo com descrições, monstros, locais, itens e todo o resto. Você irá criar aventuras, não um livro-jogo, assim, abrace o caos. Por mais que você crie alternativas, seu grupo provavelmente (muito provavelmente) escolherá um caminho que você não havia pensado. Mas, como organizar a campanha de modo tão caótico e desordenado? Touché, monsieur! Há uma certa lógica no caos... basta gerar um "caos organizado".

Abrace o caos!

Seus Jogadores não são bobos: eles sabem que você não é capaz de planejar tudo o que eles pretendem fazer e que imprevistos acontecerão. Eles também estão cientes (ao menos deveriam) que é humanamente impossível manter "um mundo inteiro funcionando", ou seja, manter centenas de PDMs ativos, em dezenas de cidades, com outras dezenas de problemas. Mas é seu papel fazer com que eles pensem que você realmente possui esse poder! É fácil, basta saber lidar com alguns fatores.

PDMS: já falamos sobre eles nas lições sobre aventuras, mas aqui o estamos falando de outros PDMs, aqueles que realmente importam. Entram nessa categoria o vilão maléfico, o rei tirano, o ranger que ajuda o grupo de tempos em tempos, o mentor do mago, enfim, os aliados e inimigos que concorreriam ao prêmio de Melhor Ator Coadjuvante no Oscar.

Crie a ficha desses caras. É trabalhoso? Com certeza, mas eles não são como aqueles que serão vistos em apenas uma aventura. Eles serão recorrentes e, talvez, as estatísticas sejam necessárias um momento ou outro. Trate-os como Personagens: eles precisam de passado, motivação e descrição detalhada. São eles que darão alma ao mundo.

Caminhos: seus jogadores querem um mundo que pareça real, certo? Logo, eles sentir-se-ão frustrados se você disser: "ah, não! Vocês VÃO ir até a Mina Abandonada porque bolei a aventura lá!". Sim, isso pode acontecer. Mas, então, o que fazer? Bom, se você realmente quer fazer uma aventura baseada em um local específico, tenha certeza de atrair seus Jogadores até lá com alguma boa isca, seja um tesouro, promessas de casamento, fama, enfim: torne aquele local irresistível à aventura!

O segundo modo de evitar esse problema é não inventar uma história situada exatamente em um local. Como? Pense nas redondezas: cidades, ruínas, acidentes geográficos, etc. Esteja preparado para jogar sua aventura em qualquer um desses locais. Difícil? Não se exemplificarmos: meus Jogadores do grupo oficial estão em Everlund. Mês que vem, quando retomarmos a campanha, eles escolherão o caminho a seguir: ir até Lua Argêntea, visitar Sundabar ou ir até Portal de Baldur devolver um grimório que encontraram em uma aventura anterior. Não pensem que eu criei três aventuras diferentes. Nada disso: criei três "plots" diferentes baseados em cada caminho. A partir deles, criarei as aventuras e seguirei em frente.
É seu papel criar o caminho que será seguido.

Vilões: para quem não lembra, "vilão" é o inimigo principal da campanha. O orc combatente de primeiro nível que guarda a sala com 12 POs NÃO é um "vilão", é um inimigo, mas não possui poder suficiente para ameaçar os Personagens. Sobre a ficha e descrição dos vilões, já falamos no tópico acima, sobre PDMs. Mas, como escolher o vilão "final" da campanha? Simples: não escolha. Melhor, escolha dois ou três e deixe que o grupo decida contra quem lançará suas forças. Vamos a um exemplo:

Na campanha que venho mestrando, os Jogadores encontraram ao menos três indícios de ações vilanescas pelo caminho: um culto de Cyric, a Casa Dlardrageth (uma família élfica que mesclou sua linhagem a seres infernais) e um terceiro grupo que não dominarei para não entregar o mandolate aos meus Jogadores, afinal, eles não são bobos e frequentam o Clérigo regularmente! Qual deles eu escolhi para ser o vilão? Nenhum. Os Jogadores é que irão direcionar os Personagens contra um deles. Talvez, eles vençam os três, por que não?

Um dos maiores vilões de todos os tempos: Luís, o Espalha Lixo.

Diário de Campanha: tá aí o ponto principal da questão. Mantenha dois diários de campanha. "Poxa!", grita o Mestre mais afoito, "mas esses posts não eram para não perder tempo?". Exatamente, meu caro pupilo: mantendo as anotações antes e durante as sessões, preparar as aventuras será muito mais fácil. O primeiro diário, aliás, pode ser mantido pelos Jogadores: uma espécie de diário de bordo dos aventureiros, descrevendo o que aconteceu nas aventuras anteriores.

O outro diário é seu e deve ser mantido em sigilo. Pegue uma agenda velha, decida um dia para o início da campanha e pense no futuro: o que os vilões farão nos próximos dias? E os aliados? Como estará o clima? Isso parece trabalhoso, mas não é e você não precisa descrever todo o dia-a-dia do infeliz: duas ou três palavras e está bom, do tipo "Malvin Draga encontra Savina". Isso cria um sentimento de urgência e de movimento simplesmente incrível! Imagine a cara de seus Jogadores ao descobrir que chegaram atrasados e que o exército orc dizimou a terra natal dos Personagens. Ou, imagine o alívio de descobrir os planos de um dos vilões e detê-lo a tempo.

Esses quatro itens (PDMs, Caminhos, Vilões e Diários) darão um pouco de trabalho para serem criados, mas, depois, serão de fácil manutenção e trarão um sem número de vantagens, desde não esquecer o que aconteceu até ganchos para novas aventuras.

E para unir as aventuras? Como proceder? Geralmente, esse é o menor dos problemas. O caminho mais fácil é realizar uma campanha de "jornada". A maioria dos livros de fantasia utilizam esse recurso: em O Senhor dos Anéis, a Comitiva precisa cruzar o continente para destruir o Um Anel; em O Hobbit, Bilbo e os Anões vivem mais aventuras indo até a Montanha Solitária do que na própria Montanha! Isso só para citar duas sagas bem conhecidas.

Campanha de jornada... ergh, bom, não DESSA jornada...

Vamos dar uma olhada na campanha de meu grupo: começamos na "Casa de Heliumk", um vilarejo no caminho entre Everlund e Lua Argêntea, duas cidades importantes do local onde a campanha ocorre. Lá, os Personagens Froyas e Ossur encontraram o PDM Halessan que lhes contou sobre o desaparecimento de uma comitiva diplomática que rumava para o sul. As duas primeiras aventuras trataram do deslocamento dos três em busca dos desaparecidos. Aí, reviravolta: Halessan é morto mas, antes de deixar o mundo, entrega ao grupo um pergaminho que deveria ser entregue a Kayl, Conselheiro-mor de Everlund. Ou seja, mais deslocamento, mais ganchos, mais aventuras até a chegada em Everlund.


Da Casa de Heliumk a Everlund, não são mais do que 50 quilômetros. Um trecho curtíssimo que rendeu dois meses de aventuras. O objetivo era chegar a Everlund, mas pistas foram encontradas, inimigos combatidos e side quests foram cumpridas. Chegando na cidade, Kayl pediu que o grupo (agora, já com um bardo e um feiticeiro que foram encontrados pelo caminho) fosse até a Floresta de Turlang. Pronto, outro deslocamento.

Resumindo: da Casa de Heliumk até Everlund, de Everlund até a Floresta, da Floresta de volta a Everlund. Nesse vai e vem, lá se foram seis meses de jogo, cinco níveis evoluídos, três possíveis vilões no caminho e, acima de tudo, grandes histórias. Tudo no método sem tempo, preparando só o que fosse realmente necessário para o andamento das aventuras. Em breve, meu grupo estará lançando um site sobre nossas campanhas, aí os exemplos serão mais fáceis de serem vistos.

Por hoje era isso, turma! Qualquer dúvida, posta um comentário aí que responderei assim que possível. Até semana que vem, com a lição sobre os PDMs e as comunidades! Sucessos decisivos a todos!
Prof. AlessandroAlessandro é professor de Inglês, Espanhol, Português, Religião e Literatura devido à profissão. Cineasta, cientista, astrônomo (não astrólogo...), artista plástico, ator, músico, linguista, poliglota, crítico e escritor devido à paixão. Leitor, RPGista, nerd, cinéfilo, enólogo e ocultista devido à diversão. Maníaco por cultura devido a algum mal genético. Ah, e chato, por pura força de vontade.

8 comentários:

  1. sobre criar pdms: nao precisa ser algo complexo. consultem os modulos do 1ed, e verao q nao precisa colocar todo o santo atributo. minha sugestao é algo simples, como:

    Zé (humano, mago 3).At X, Def X, PV X, JP X. Bonus +1 DES e INT. Adaga (1d4). mAgias (2/1): Essa, essa outra e aquela. Homem alto e careca, taciturno.


    simples assim, sem precisar colocar grandes detalhes. caso a necessidade surja, tipo, ter q fazer um teste de CON, o mestre cria no hora. caso precise saber quanto dinheiro, se ele tem um cantil ou se ele tem uma tocha, isso tudo o metre faz no ato

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  2. coloca a mão no papel e caneta que vai começar o improvisation ,Improvisation , o Improvisation é bombom o Improvisation é bombombom , coloca a mão no papel e caneta que vai começar ....

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  3. Ops... desculpem, a postagem foi ao ar sem nome... falha arrumada! Um abraço!

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  4. Mais um ótimo post.
    Gostei muito da dica de criar uma aventura genérica, que pode ser adaptavel a diferentes situações conforme o desenrolar do jogo.

    Gostaria de uma dica professor, atualmente mestro um cenário medieval para um grupo "maligno", no maximo poderiamos chama-los de mercenários(no maximo mesmo).
    Alguma dica de como levar a aventura ou campanha para um grupo o qual salvar vilarejos ou o reino estaria praticamente fora de congitação?

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  5. Mais um excelente post caro professor! Esta sua série está me ajudando enormemente com minha atual campanha.

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  6. Obrigado pelos comentários, galera! Raphael, grupos malignos possuem excelentes oportunidades de interpretação, desde que o grupo seja maduro.
    Evidente que salvar pessoas não será rotina deles,então, a questão é oferecer outro tipo de aventura ou "força-los" a serem "bondosos":
    Outros tipos de aventura: quais os objetivos do grupo? Vamos supor que a intenção deles seja dominar uma rota comercial. Bom, para isso, eles precisam vencer muitos soldados rasos, conquistar influência e "remover" algumas peças do jogo. Ou seja, aventuras com espionagem, traições e fugas são a melhor opção. Mesmo não sendo politicamente correto, pense no jogo GTA, ou melhor, no "Poderoso Chefão".
    A segunda opção também é boa: "forçá-los" não significa obrigá-los, mas sim tornar irresistível ajudar os outros. Promessas de boas recompensas, chances de conquistar confiança, etc. Pense, se o objetivo for dominar o reino, nada melhor do que ser amigo íntimo do rei e, depois, tramar o golpe de dentro do castelo. Às vezes, é preciso bancar o bonzinho para ganhar a oportunidade do bote. Você ainda pode usar a técnica empregada pela Dragão Brasil na série "O Grupo do Mal": todos estavam amaldiçoados e se um deles morresse, outro também morreria, aleatoriamente. Logo, eles eram obrigados a cooperar... hehehe! Espero ter ajudado.

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  7. Valeu pelas dicas professor. Já estou com algumas boas ideias. Obrigado.

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